quarta-feira, 20 de abril de 2016

Cultura e arte global



Sidney: Como é morar na cidade mais multicultural da Austrália


O estudante de agronomia Felipe Hickmann aceitou o desafio e foi passar um ano do outro lado do mundo. Saiba o que ele diz sobre a experiência.
Por Felipe Hickmann


Meu nome é Felipe, sou estudante de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e bolsista do programa Ciência sem Fronteiras na University of Technology Sydney, UTS. Resolvi escrever essa coluna para falar um pouco sobre a minha experiência aqui na universidade, assim como compartilhar quais são as melhores partes de realizar um intercâmbio em Sidney, Austrália.

A qualidade da educação australiana é reconhecida internacionalmente e o país possui várias universidades entre as melhores do mundo em diferentes rankings. A UTS, onde estudo, por exemplo, foi classificada como a melhor universidade australiana e a vigésima primeira colocada global entre as universidades com menos de 50 anos. Localizada no coração de Sidney, a UTS possui mais de 40 mil estudantes de graduação e pós-graduação de diversas partes do mundo.

Além da qualidade do ensino, Sidney está entre as 5 melhores cidades do mundo para estudantes, de acordo com o Ranking QS. E eu concordo! Nas primeiras semanas do meu intercâmbio, o que mais me chamou a atenção foi a diversidade cultural da cidade. É um ambiente verdadeiramente multicultural com pessoas de diversas parte do mundo vivendo de forma harmônica.

Além de melhorar minha fluência no inglês, o intercâmbio está sendo para mim uma ótima oportunidade de crescimento pessoal e profissional. Ao longo da minha estadia aqui em Sidney, tenho buscado dividir apartamentos com pessoas de diferentes países e em diferentes regiões da cidade, o que me possibilita trocar experiências e aprendizados sob diferentes pontos de vista.

A metodologia de ensino utilizada na universidade é muito diferente do que eu estava acostumado no Brasil. Normalmente, as aulas da graduação são compostas por lectures – aulas expositivas compartilhadas com diferentes cursos de graduação da instituiçãoseguidas de tutorials, com um número reduzido de alunos, visando aprofundar o conteúdo explorado em sala de aula.

A minha carga horária de aulas é menor quando comparada com a do meu curso no Brasil. No entanto, as atividades fora de sala, como a produção dos famosos essays, são maiores. Esta flexibilidade de horário permite que os estudantes tenham um part-time job para cobrir o custo de vida elevado de Sidney, além de estimular o aprendizado de forma autônoma e independente.

Os estudantes podem desenvolver suas atividades extracurriculares conforme suas respectivas necessidades, interesses e condições. Para mim, estar na UTS é uma oportunidade única de desenvolver pesquisa de ponta em parceria com algumas das melhores universidades do mundo. Por isso, estou focando em trabalhos e projetos de pesquisa nas áreas de economia rural e sustentabilidade em diferentes cadeias produtivas. Além disso, junto com o meu grupo de trabalho da UFGRS, também tenho a possibilidade de desenvolver pesquisas em outras universidades australianas, como a University of Sydney e a University of Melbourne – gostei tanto desta última que pretendo realizar lá meu estágio curricular de conclusão de curso no próximo verão.
Confesso que foi um grupo de amigos e colegas de curso, no Rio Grande do Sul, que me motivaram a realizar o intercâmbio. No início, não estava muito confiante, mas acabei mudando de ideia e aceitando o “desafio”. Não podia ter feito escolha melhor: Sydney está superando todas as expectativas! Faria tudo de novo, de novo e de novo!


quarta-feira, 13 de abril de 2016

Música Brasileira eterna



Maior projeto de circulação musical do país começa nesta quinta em Belém
  • 13/04/2016 05h56
  • Rio de Janeiro
Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil




Será lançada amanhã (14) em Belém (PA) a 19ª edição do projeto Sonora Brasil Sesc, que vai levar até o fim do ano 418 espetáculos a 114 cidades de todos os estados. Os temas escolhidos para o biênio 2015/2016 foram Violas Brasileiras e Sonoros Ofícios – Cantos de Trabalho.

O assessor de música do Departamento Nacional do Serviço Social do Comércio (Sesc), Thiago Sias, explica que o projeto tem como objetivo difundir o trabalho de artistas que construíram uma obra não comercial, além de formar plateias pelo contato do público com música de qualidade e diversificada, principalmente no interior do país.
“O público já conhece bem o projeto, até pela carência de programação artística, principalmente dessa vertente. Muitos já conhecem o projeto a tal ponto que não vão para prestigiar o grupo ou o músico, mas para prestigiar o Sonora Brasil. Porque sabem que lá sempre haverá uma apresentação tematizada, de algum elemento que vai contar um pouco do desenvolvimento histórico da música no Brasil. E vai sempre receber um grupo que despertará essa curiosidade musical, de uma apresentação diferenciada, independentemente do artista”.

O projeto teve início em 1998 e já contou com cerca de 80 grupos, em mais de 4.900 apresentações por todo o país, que alcançaram 520 mil espectadores. Só no ano passado, foram mais de 50 mil espectadores, que também têm a oportunidade de conversar com os músicos após as apresentações e conhecer mais os instrumentos utilizados, segundo Sias.

“Esse projeto também tem, em alguns casos, oficinas, aulas de aperfeiçoamento do instrumento ou até mesmo palestras sobre a temática. Todas as apresentações, principalmente no tema das Violas Brasileiras, são semididáticas, todas as músicas são contextualizadas e os músicos ficam para um bate-papo com o público ao final dos concertos. O público tem a oportunidade de conhecer, fazer perguntas, tocar nos instrumentos. No caso das violas, são raras, como a viola de cocho, a de buriti, a caiçara e a viola machete”.

Além da rede Sesc, as apresentações ocorrem, por meio de parceria, em locais como escolas, terreiros e igrejas. Cerca de 80% dos concertos são gratuitos e os demais são a preços simbólicos, de no máximo R$ 5.

O tema Violas Brasileiras apresenta cinco variantes do gênero, cada um com características peculiares e regionais do instrumento. Paulo Freire e Levi Ramiro (SP) representam a viola caipira/sertaneja; a viola do Nordeste dos repentistas vem com Ivanildo Vilanova, Antônio Madureira e Cássio Nobre (PE e BA); a viola de concerto será com Fernando Deghi (PR) e Marcus Ferrer (RJ); e as violas singulares serão apresentadas por Sidnei Duarte (MT), Maurício Ribeiro (TO) e Rodolfo Vidal (SP). Os grupos da temática violas vão circular este ano pelas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, depois de terem percorrido o Sul e o Sudeste no ano passado.

O tema Sonoros Ofícios – Cantos de Trabalho inverte a rota e leva para as regiões Sul e Sudeste a expressão musical relacionada às atividades laborais, presente na cultura brasileira rural e urbana desde o século 18. As formas tradicionais rurais serão apresentadas pelos grupos Destaladeiras de Fumo de Arapiraca (AL); Cantadeiras do Sisal e Aboiadores de Valente (BA); e Quebradeiras de Coco Babaçu (MA). O grupo Ilumiara (MG), formado por músicos pesquisadores, leva um repertório recolhido de diversas vertentes.

O concerto de abertura será no Teatro Margarida Schivasappa, às 20h, com a apresentação dos violeiros Fernando Deghi e Marcus Ferrer e do grupo Cantadeiras do Sisal e os Aboiadores de Valente.
Edição: Graça Adjuto

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Fé em Minas



Procissão cultural encena lendas do folclore popular nas ruas de Mariana
  • 26/03/2016 12h19
  • Mariana (MG)
Leo Rodrigues - Correspondente da Agência Brasil








 Uma das atrações da Semana Santa de Mariana é a Procissão das Almas, manifestação cultural que ocorre na madrugada da sexta-feira para o sábadoLéo Rodrigues/Agência Brasil

Nem só de religiosidade se faz a Semana Santa em Mariana (MG). Na noite de ontem (25), quando se celebrou a Sexta-Feira da Paixão, um grupo de 60 pessoas saiu às ruas para encenar lendas do folclore popular da cidade. Acompanhada sempre por olhares de uma centena de curiosos, a Procissão das Almas carrega uma tradição de aproximadamente 35 anos.

O cortejo é organizado pelo Movimento Renovador, uma iniciativa sociocultural independente cujo objetivo é contribuir para a preservação do patrimônio material e imaterial da Mariana. "Nós realizamos pesquisas sobre os elementos tradicionais e folclóricos da sabedoria popular", explica a integrante do movimento e uma das coordenadoras Procissão das Almas, Hebe Maria Rola Santos.

 Na Procissão das Almas, as pessoas se vestem todas de branco, escondendo seus rostos sob um capuz. Elas carregam um osso e uma vela. Léo Rodrigues/Agência Brasil

Aos 84 anos, Hebe é também professora de literatura emérita da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Fascinada por histórias e contos populares, ela conta casos curiosas como a de um homem com dificuldades de locomoção que, após sete anos participando da Procissão das Almas, apareceu sem muletas na penúltima edição. "Ele jura que foi curado pelo nosso cortejo. Vou dizer o que para ele?".

Duas lendas
Na Procissão das Almas, as pessoas se vestem todas de branco, escondendo seus rostos sob um capuz. Elas carregam um osso e uma vela e param em frente às igrejas que possuem cemitério para entoar uma canção. No meio do grupo, um participante fantasiado de morte segue carregando uma foice, enquanto Hebe Rola incorpora um personagem que carrega um cesto cheio de penas, que são jogadas para o alto de tempos em tempos. Esses três elementos, ossos, penas e cemitérios, se remetem a duas lendas populares da cidade e uma história real.

Diz a primeira lenda que uma senhora chamada Maricota passava seus dias na janela, fiscalizando a vida alheia. Era uma fofoqueira, na linguagem popular. Como já estava com má fama devido ao seu comportamento, decidiu mudar de bairro e também alterou seus hábitos: em vez de ficar na janela durante o dia, Maricota passou a ser vigilante noturna. Como Mariana tinha toque de recolher às 21h, o objetivo dela era delatar os infratores.
Uma noite de sexta-feira santa, viu uma procissão se aproximar, mas as pessoas escondiam o rosto dentro do capuz. Ela ouvia lamúrias, som de bumbo, correntes arrastando e uma canção: "Reza mais, reza mais, reza mais uma oração; reza mais, reza mais, pra alma que morreu sem confissão". Como ela não conseguia identificar quem estava ali, começou a ficar intrigada sobre o cortejo que até então desconhecia.

  O cortejo é organizado pelo Movimento Renovador, uma iniciativa sociocultural independente cujo objetivo é contribuir para a preservação do patrimônio material e imaterial da Mariana Léo Rodrigues/Agência Brasil

De repente, um dos integrantes veio em sua direção dizendo que a noite é dos mortos e pediu para que ela guardasse a sua vela que mais tarde voltaria para buscar. Maricota ficou feliz por ver que finalmente alguém lhe tinha confiança. Quando a procissão voltou, a mesma figura novamente lhe procurou. Ela então foi buscar a vela, que surpreendentemente havia se transformado em um osso de perna de defunto. "O final possui mais de uma versão, sendo que em uma delas a fofoqueira morre de susto e passa a integrar anualmente a procissão dos mortos", conta Hebe.

A segunda lenda se remete a uma senhora classificada como "barata de igreja" que é, na linguagem local, a mulher que está sempre bajulando o padre. Com a contratação de uma jovem moça para ajudar nas escrituras da paróquia, essa senhora fica muito enciumada. Ela, então, começou a espalhar o boato de que a nova funcionária era namorada do padre e, para conferir credibilidade à sua história, colocou sapatos do sacerdote sob a cama da moça.

Com o escândalo, a jovem perdeu o noivo, foi expulsa de casa pelos pais e virou andarilha. Um dia, ela retornou bem maltrapilha e bateu à porta de uma casa solicitando água. Enquanto a moradora atendia ao seu pedido, a moça caiu morta. O enterro foi organizado e toda a cidade, curiosa, compareceu para ver a falecida. Quando a "barata de igreja" chegou, o defunto sentou no caixão e disse "está aqui quem me caluniou".

 A Procissão das Almas, em Mariana, carrega uma tradição de aproximadamente 35 anos. Léo Rodrigues/Agência Brasil

Desesperada, a senhora correu atrás do padre, que lhe repreendeu e lhe deu um castigo inusitado: recolher penas de aves em todas as casas onde há abatedouros no quintal, organizá-las em balaios, deixá-las no alto do morro e esperar que um vento forte espalhe-as por toda a cidade. Ao fim, conforme Hebe Rola, ela deveria recolher até a última pena. "Segundo a lenda, em toda sexta-feira da paixão, ela transita pelas ruas de Mariana coletando as penas".

A Procissão das Almas faz ainda referência a uma história real, cujo personagem central é um maestro de Mariana. Ele criou o hábito, em todo o Sábado de Aleluia, de se dirigir aos cemitérios onde haviam músicos enterrados para tocar uma canção em homenagem a eles.

Morte
Embora tenha um viés cultural, a Procissão das Almas é também uma reza pelos que já se foram. Há pessoas na cidade que, pela referência aos mortos, têm medo do cortejo. É o caso do taxista Antônio Silva. "Na dúvida, prefiro evitar", disse.

Aos 23 anos, o estudante de arquitetura Felipe D'ângelo superou o medo. Natural de Mariana, ele se vestiu de branco e integrou o cortejo pela primeira vez. "Sempre tive vontade de participar, mas desde criança eu tinha medo. Há uma mística na cidade em torno dessa procissão. Acho legal a interação que existe com as praças e as igrejas da cidade".

Já o psicólogo Fábio Maia, de Belo Horizonte, escolheu Mariana para passar o feriado e ficou fascinado com o cortejo. "Estou achando fantástico porque ela foge do lugar-comum. Eu tenho 56 anos e nunca vi uma procissão igual na minha vida. Aliás, eu não sou religioso, então essa é a única procissão que eu seguiria".



Mariana (MG) - Uma das atrações da Semana Santa de Mariana é a Procissão das Almas, manifestação cultural que ocorre na madrugada da sexta-feira para o sábado (Léo Rodrigues/Agência Brasil)
Edição: Aécio Amado