domingo, 27 de dezembro de 2015

A interessante música alemã

Nem tudo eram rosas


Dos primeiros ensaios na cozinha às paradas de sucesso, o duo berlinense Rosenstolz trilhou um caminho árduo. Hoje, até o prefeito de Berlim corre para vê-los no palco. Mas não foi sempre assim.

Rosenstolz ficou muito tempo associado à cena gay

Eles encerraram sua última turnê com chave de ouro: após 27 shows esgotados por todo o país, o duo berlinense Rosenstolz levou 17 mil fãs berlinenses ao delírio em um show a céu aberto. Até Klaus Wowereit, prefeito da capital, estava presente. Uma semana após seu lançamento, o atual disco Herz (Coração) foi premiado com o disco de ouro e em oito semanas alcançou o de platina.

Mas a carreira de AnNa R. e Peter Plate não foi sempre assim. Para muitos, os Rosenstolz eram uma banda difícil de entender. Primeiro porque, durante muito tempo, o duo ficou reservado à cena gay (Peter assumiu sua homossexualidade aos 19 anos). Além disso, sua música não é de fácil classificação: os Rosenstolz gostam de percorrer os caminhos mais exóticos para chegar à música pop.

Mesmo no auge do sucesso, o duo ainda marca presença na cena onde começou. Peter Plate é hoje dono de um bar em Schöneberg, o bairro gay de Berlim. A banda também se envolve ativamente em questões sociais: a cada turnê, os Rosenstolz doam centenas de milhares de euros à Deutsche Aidshilfe, a associação alemã de ajuda aos portadores do HIV.

Ensaios na cozinha
Desde pequena, AnNa R. tentava a carreira de cantora na então Berlim Oriental, embora não tenham sido poucas as vezes em que foi aconselhada a desistir dos ambiciosos planos. Com uma canção de Whitney Houston, ela lutou por uma vaga na Escola de Música de Friedrichshain, bairro onde nasceu. Sem sucesso.

Peter Plate nasceu no outro lado mundo, em Nova Délhi, Índia, onde seu pai trabalhava como diplomata, e foi trazido mais tarde pelo padrasto para a região do Harz, no estado alemão da Baixa Saxônia. Após a queda do muro de Berlim, Peter tomou a decisão acertada de ir para a capital, que vivia então seus tempos áureos.

Peter logo encontrou um apartamento e foi o próprio locador quem lhe apresentou AnNa. Os dois começaram imediatamente a compor juntos. Os primeiros ensaios aconteceram na cozinha do apartamento de Peter, escondido nos fundos de uma velha casa - o banheiro, diga-se de passagem, ficava do lado de fora, na escadaria.

Os primeiros shows
O primeiro show foi coisa para amigo: dos 30 presentes, apenas 15 eram pagantes. Mesmo assim, AnNa levou a cabo sua idéia de vestir uma roupa diferente a cada canção. Um pesadelo para Peter, que teve de lidar com a inquieta platéia sozinho. Mas os shows continuaram até que o duo chamou a atenção de Tom Müller, naquela época produtor de Nina Hagen. Juntos, eles lançaram em 1992 o álbum de estréia Soubrette werd' ich nie. O disco vendeu mal, mas nele estão canções que hoje fazem parte de qualquer show do duo.

Dois anos depois, em 1994, veio o álbum seguinte, Nur einmal noch (Só mais uma vez). Eles juntaram algum dinheiro e fizeram um vídeo, que nenhuma emissora transmitiu. Mas enfim uma boa notícia: em 1995, todos os mil ingressos para a apresentação de ambos na casa de shows Metropol foram vendidos e uma data extra teve de ser arranjada. AnNa e Peter estavam no caminho certo.

O contrato
Em 1996, a banda passou ao universo das grandes gravadoras, ao assinar um contrato com a Polydor. Em 1997, veio o álbum Die Schlampen sind müde (As vagabundas estão cansadas), que alcançou a posição 33 da parada. Um ano depois, veio o convite para disputar quem representaria a Alemanha no festival Eurovision e o Rosenstolz acabou ficando em segundo lugar. Uma derrota que foi, na verdade, uma vitória: a banda caiu nas graças do público e, pela primeira vez, emplacou um single na parada alemã.

O disco Zucker (Açúcar), de 1999, foi sucesso garantido: emplacou direto na segunda posição da parada. O caminho era sem volta: hoje, eles são figurinha carimbada na cena musical alemã e os discos que seguiram passam longas temporadas nas paradas de sucesso.


sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Esse Brasil...

Crítica social e diversidade musical no show de Criolo em Berlim


Um dos mais celebrados artistas da nova geração retorna à capital alemã para apresentar disco "Convoque seu Buda", mistura certeira de música urbana e ritmos brasileiros.



Foi quase uma experiência religiosa – Criolo tocou o coração e a consciência do animado público que, no sábado passado (24/01), lotou mais uma apresentação do músico brasileiro em Berlim.

Entre alemães e brasileiros, a entusiasmada audiência dançava e cantava sucessos de Nó na orelha, álbum de 2011 que levou o trabalho do paulistano ao grande público, e de Convoque seu Buda, o mais recente disco, lançado em novembro de 2014.

"Esta oportunidade proporciona encontros com novas culturas, com outras formas de se pensar o mundo e, em algum momento, isso pode desaguar em alguma parte da minha construção artística", disse Criolo, em entrevista à DW Brasil.

No palco, as palavras de Criolo criam um vívido painel da sociedade brasileira, que, visto de fora, parece difícil de ser celebrado. Sua poesia tem a força crítica do rap, mas o músico foge dos clichês baseados no ódio, criando belas cadências, embaladas por uma mistura original de hip hop e ritmos brasileiros.
"É uma emoção muito grande. Nunca imaginei viver o que estou vivendo, tanto com o Nó na orelha, quanto com este novo álbum. São oportunidades únicas e especiais de propor um olhar nosso, que encontra o olhar do outro – afinal de contas, são pontos de vista", comentou.
Trabalho coletivo


Assim como no disco anterior, a música de Criolo é guiada pelo trabalho coletivo. Convoque seu Buda tem produção musical de Marcelo Cabral e Daniel Ganjaman.

"Eu cheguei com as canções, e outras canções foram construídas em estúdio. Esta pluralidade surge mais uma vez do encontro com o Marcelo e o Daniel, contribuindo com a construção musical desse momento", comentou Criolo.

Além da dupla de produtores, Criolo contou com a colaboração dos compositor Douglas Germano, Kiko Dinucci e Rodrigo Campos, das cantoras Tulipa Ruiz e Juçara Marçal, e do americano Money Mark, conhecido por suas colaborações com o grupo de rap nova-iorquino Beastie Boys.

"Houve também uma participação maior de todos os músicos que me acompanham na estrada, criando assim uma unidade sonora que reflete as experiências e as vivências desses anos de encontro e trabalho", disse o paulistano.

Cabral e Ganjaman também fazem parte da afiada banda que acompanhou Criolo em sua apresentação em Berlim, que teve ainda as participações especiais do rapper alemão Peter Fox e de membros da banda Seeed.

Crítica pungente
Com Convoque seu Buda, o músico mais uma vez apresenta novas possibilidades para o caminho trilhado pelo rap nascido em São Paulo. A raiz do disco está na periferia, e ela se reflete na intensidade das batidas, na diversidade musical, nos versos corpulentos e na crítica social contundente.

A crítica social de Criolo é feita de forma criativa e sem deixar de ser pungente – as letras são um retrato das diferenças, da injustiça e da criminalidade brasileiras, mas elas sempre revelam respeito e até mesmo ternura pelos seus personagens.

Assim, Criolo fala de um funcionário de bufê que serve festas de luxo em Cartão de visita, de meninos que seguram fuzis na densa Plano de voo, de um padeiro que não chegou ao trabalho devido à greve no samba Fermento pra massa e de um morador de rua usuário de crack em Casa de papelão.

"O Brasil é um país jovem, que herdou um modo de se criar uma sociedade que tem como reflexo uma situação muito delicada. Nesse período de quatro anos entre um álbum e outro, o que eu percebo é que cada vez mais nossos jovens estão se reunindo, se organizando e trabalhando para que tenhamos uma sociedade mais justa", disse o artista.
LEIA MAIS


sábado, 5 de dezembro de 2015

Mais um adeus na dramaturgia

No velório, colegas artistas destacam a grandeza da atriz Marília Pêra.


05/12/2015 18h51Rio de Janeiro
Paulo Virgílio – Repórter da Agência Brasil












A atriz Marília Pêra participou, em outubro de 2015, do programa  Kinoscope, da Rádio MEC FM, da EBCAna Paula Migliari/Arquivo TV Brasil





Dezenas de amigos, em grande parte colegas de profissão, estiveram na tarde de hoje (5) no velório da atriz Marilia Pêra, que morreu na manhã deste sábado, aos 72 anos, de um câncer no pulmão. O velório ocorreu na casa de espetáculos que leva o nome da atriz, a Sala Marília Pêra do Teatro do Leblon, na zona sul do Rio.

O acesso ao teatro foi restrito até às 15h30 a familiares e amigos. Somente a partir desse horário é que foi permitida a entrada de fãs e de jornalistas, antecedendo a saída do corpo para o sepultamento, marcado para às 17h no Cemitério São João Batista, em Botafogo, também na zona sul carioca.

No ano passado, já enfraquecida pela doença, Marília Pera dirigiu a atriz Cláudia Ohana numa remontagem da peça Callas, que a própria Marília havia interpretado em 1996, sobre a vida da célebre cantora lírica Maria Callas. Ao chegar para o velório, Claudia Ohana lembrou que, mesmo doente, Marília não perdeu a firmeza. “Ela estava bem fraca, mas era muito exigente, com o horário, com a fala, com o texto. Ela era muito firme, mas com a voz calma, sempre doce. Por causa dela, eu ganhei coragem para fazer um monólogo”, contou a atriz.

Outra atriz, Joana Fomm, não conseguiu conter a emoção ao falar da colega, com quem chegou a contracenar em um especial da TV Globo. “A Marília foi uma das maiores atrizes do mundo”, disse Joana, com a voz embargada. “Ela foi muito bacana comigo quando atuamos juntas. Também foi muito generosa comigo quando eu estive doente. Marília era uma pessoa especial”.

A atriz Nicette Bruno chegou de braços dados com as filhas, as também atrizes Beth Goulart e Bárbara Bruno. “Marília merece a nossa homenagem por tudo que fez pelo teatro, pela arte e pelo Brasil”, declarou Beth Goulart, ao entrar para o teatro onde o corpo foi velado.

Estiveram também no velório os atores Miguel Falabella, Marcos Caruso e Gracindo Júnior e as atrizes Arlette Salles, Cássia Kiss e Marieta Severo.

“Estou pasma com a perda de uma das maiores atrizes brasileiras, quando ainda se esperava muito dela”, disse a ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda, em declaração postada em seu perfil no Facebook. “Acompanhei a carreira de Marília Pera desde, praticamente, o início e sempre notei nela uma atriz única, inimitável, com humor, leveza, força e intensidade, com total domínio do personagem e de tudo que se passava em cena. Era absolutamente sensacional assisti-la atuando”, afirmou.

Uma das últimas participações de Marília Pera foi no programa Kinoscope, da Rádio MEC FM, da EBC no Rio de Janeiro. A entrevista foi feita pelo produtor e apresentador Fabiano Canosa, em setembro passado na casa da atriz, em Ipanema, e foi ao ar em 15 de outubro último.

Marília revelou detalhes de sua trajetória ao apresentador do programa, dedicado à música feita para o cinema. Canosa abriu o programa com um sucesso de Carmen Miranda na voz de Marília, que também relembrou as outras cantoras que reviveu no teatro, como Dalva de Oliveira, Ellis Regina e Maria Callas.

Ainda no programa, que vai ao ar às quintas-feiras, às 22h, Marilia Pêra falou do filme Pixote, de Hector Babenco, que lhe valeu em 1981 o prêmio da Sociedade Nacional de Críticos dos Estados Unidos. Na película, a atriz interpretou a prostituta Sueli. "Um radialista perguntou se eu era prostituta mesmo. Fui fazer uma entrevista na rádio e ele perguntou. E eu falei: que elogio!", lembrou.

Abaixo o link com o áudio do programa.



Edição: José Romildo